sexta-feira, agosto 31

'Uma Noite em Casa de Amália': uma excelente tertúlia

'Uma Noite em Casa de Amália' marca o regresso do gigante Filipe La Féria à encenação com um texto da sua autoria e um outro retorno: há muito que eu e os meus pais não nos sentávamos lado-a-lado no Politeama. Deixo desde já uma breve contextualização ao tempo histórico da peça.

Véspera de Natal de 1968: vivem-se altas temperaturas com o rebentação da guerra colonial, em Angola, e com o estado de saúde de A. O. Salazar; Marcello Caetano ascende ao trono. Portugal e o Estado Novo estão numa situação fragilizada, sobre escassas hipóteses de que o equílibrio político imposto triunfasse, novamente.
Entretanto, o Futebol e o Fado são as escapatórias do povo que vive aprisionado à sua própria condição, mergulhado na inércia asfixiante.



Esta viagem à Primavera Marcelista, antes de sucumbir o regime ditatorial, Amália promove uma tertúlia em sua casa para receber o grande poeta (não somente brasileiro mas do Universo), Vinícius de Moraes, que será o seu último dia de viagem em Portugal, mais precisamente em Lisboa. Ary dos Santos, Natália Correia, David Mourão Ferreira, Maluda e outros compõem uma mistura de personagens com diversos ideais e inflamáveis linhas de pensamento que cruzarão fogo nas palavras.
Este encontro em palco entre os nossos Fado, Folclore e Humor, e os ritmos do Samba e da Bossa Nova, converte-se numa pura homenagem à cultura portuguesa e à veia mobilizadora dos portugueses. Com Amália Rodrigues a dirigir a tertúlia poética, são muitas as canções interpretadas de mãos dadas a Vinícius de Moraes, dando origem a uma maré libertária da alma colectiva do povo português.

O texto de La Féria lança-nos as sementes da ruptura e da revolução intelectual que o nosso país necessitava na época e hoje - subnutrido em inspiração e coragem -, escasseiam os movimentos e agrupamentos nas novas gerações com o intuito pensante e de abertura que nos permitam subir o degrau; os rasgos de alegria contra o abuso de poder ou o exercício duma cidadania mais digna, em nome daqueles que levaram Portugal a outro patamar.

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